sexta-feira, 27 de julho de 2012

Hoje veremos poemas de Manuel Bandeira um grande representante do Modernismo brasileiro.



Manuel Banderia é dos meus poetas preferidos (como muitos outros). Pus vários de seus poemas. Alguns não poderia deixar de citá-los, como é o caso de PoéticaNua, dois dos  meus favoritos.





Manuel Carneiro de Sousa Bandeira Filho (foto), nasceu em 19 de abril de 1886 na cidade de Recife-PE. Foi um representante do Modernismo brasileiro. Poeta, crítico literário e de arte, professor de literatura e tradutor brasileiro.
Tendo seu primeiro livro, A cinza das horas, publicado em 1917, dando continuidade então à sua produção literária, publicando também outra obra, em 1919, Carnaval.
Seus poemas transmitem emoções. Assim sendo, sua criação se subdividi-se em três vertentes básicas: a fase pós-simbolista, na qual deixa escapar traços ainda ligados ao espírito decadentista do Simbolismo, como também à musicalidade formal. Como é o caso do poema Desencanto. A fase modernista, na qual ele “direciona” seus versos para uma linguagem envolta por um tom coloquialista (fazendo uso dos versos livres e brancos), exemplo do poema Poética. E por fim A fase pós-modernista, na qual ele faz uma espécie de mesclagem entre o uso dos versos rimados e tradicionais com o uso de versos livres e brancos, bem como as formas populares, como o rondó – caracterizado por um poema com apenas duas rimas e formado de três estrofes, totalizando quinze versos.

*Alguns dados foram tirados do site Brasil Escola.





DESENCANTO

Eu faço versos como quem chora
De desalento. . . de desencanto. . .
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente. . .
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca,
Assim dos lábios a vida corre,
Deixando um acre sabor na boca.

- Eu faço versos como quem morre.




POÉTICA

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público
com livro de ponto
expediente protocolo e manifestações
de apreço ao sr. diretor

Estou farto do lirismo que pára e
vai averiguar no dicionário
o cunho vernáculo de um vocábulo

Abaixo os puristas

Todas as palavras sobretudo os
 barbarismos universais
Todas as construções sobretudo
 as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo
 os inumeráveis

Estou farto do lirismo
namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que
 quer que seja fora de si mesmo.

De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos
 secretário do amante exemplar
com cem modelos de cartas e as
diferentes maneiras de agradar
às mulheres, etc.

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.





RONDÓ DOS CAVALINHOS

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Tua beleza, Esmeralda,
Acabou me enlouquecendo.

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O sol tão claro lá fora
E em minhalma — anoitecendo!

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
Alfonso Reys partindo,
E tanta gente ficando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
A Itália falando grosso,
A Europa se avacalhando...

Os cavalinhos correndo,
E nós, cavalões, comendo...
O Brasil politicando,
Nossa! A poesia morrendo...
O sol tão claro lá fora,
O sol tão claro, Esmeralda,
E em minh’alma — anoitecendo!



NUA


Quando estás vestida,
Ninguém imagina
Os mundos que escondes
Sob as tuas roupas.

Assim, quando é dia,
Não temos noção
Dos astros que luzem
No profundo céu.

Mas a noite é nua,
E, nua na noite,
Palpitam teus mundos
E os mundos da noite.

Brilham teus joelhos,
Brilha o teu umbigo,
Brilha toda a tua
Lira abdominal.

Teus exíguos
- Como na rijeza
Do tronco robusto
Dois frutos pequenos –
Brilham.

Ah, teus seios!
Teus duros mamilos!
Teu dorso! Teus flancos!
Ah, tuas espáduas!
Se nua, teus olhos
Ficam nus também:
Teu olhar, mais longe,
Mais lento, mais líquido.

Então, dentro deles,
Bóio, nado, salto
Baixo num mergulho
Perpendicular.

Baixo até o mais fundo
De teu ser, lá onde
Me sorri tu’alma
Nua, nua, nua…




POEMETO ERÓTICO


Teu corpo claro e perfeito,

- Teu corpo de maravilha,

Quero possuí-lo no leito

Estreito da redondilha...

Teu corpo é tudo o que cheira...

Rosa... flor de laranjeira...

Teu corpo, branco e macio,

É como um véu de noivado...

Teu corpo é pomo doirado...

Rosal queimado do estio,

Desfalecido em perfume...

Teu corpo é a brasa do lume...

Teu corpo é chama e flameja

Como à tarde os horizontes...

É puro como nas fontes

A água clara que serpeja,

Que em cantigas se derrama...

Volúpia da água e da chama...

A todo momento o vejo...

Teu corpo... a única ilha

No oceano do meu desejo...

Teu corpo é tudo o que brilha,

Teu corpo é tudo o que cheira...

Rosa, flor de laranjeira...





RECIFE


Há quanto tempo que não te vejo!

Não foi por querer, não pude.

Nesse ponto a vida me foi madrasta,

Recife.

Mas não houve dia em não te sentisse dentro de mim:

Nos ossos, nos olhos, nos ouvidos, no sangue, na carne,

Recife.

Não como és hoje,

Mas como eras na minha infância,

Quando as crianças brincavam no meio da rua

(Não havia ainda automóveis)

E os adultos conversavam de cadeira nas calçadas

(Continuavas província,

Recife).

Eras um Recife sem arranha-céus, sem comunistas,

sem Arrais, e com arroz,

Muito arroz,

De água e sal,

Recife.

Um Recife ainda do tempo em que o meu avô materno

Alforriava espontaneamente

A moça preta Tomásia, sua escrava,

Que depois foi a nossa cozinheira

Até morrer,

Recife.


Ainda existirá a velha casa senhorial do Monteiro?

Meu sonho era acabar morando e morrendo

Na velha casa do Monteiro.

Já que não pode ser,

Quero na hora da morte, estar lúcido

Para te mandar a ti o meu último pensamento,

Recife.

Ah Recife, Recife, non possidebis ossa mea!

Nem os ossos nem o busto,

Que me adianta um busto depois de eu morto?

Depois de morto não me interesará senão, se possível,

Um cantinho no céu,

"Se o não sonharam", como disse o meu querido João de Deus,

Recife.

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